Faz hoje dois meses que a minha mãe morreu. Continua a
parecer-me impossível saber que nunca mais vou poder abraçá-la, beijá-la ou
simplesmente falar com ela.
Foram dois meses intensos de trabalho em sua casa, para
desmontar tudo e vazá-la.
O trabalho em casa de cada um continua, com papéis e fotos
para ver e decidir o que se há de fazer com eles.
Algumas pessoas ficaram surpreendidas com a morte da minha
mãe, acharam-na repentina, talvez por não saberem o seu real estado de saúde.
Nós tivemos dois anos e meio para nos prepararmos, mas na
realidade nunca estamos preparados.
Nos últimos dois meses da sua vida, os quais ela os passou
internada, assistimos à sua deterioração, deixou de andar, inchou com a
cortisona, apareceu-lhe “zona” o que lhe dava dores horríveis que só amenizavam
com morfina, perdeu o cabelo e por fim, mal falava.
Nos últimos dias nós só pedíamos a Deus e aos médicos que
ela não sofresse mais, sentíamos que estávamos a ser egoístas ao querer que ela
permanecesse viva unicamente para sentirmos que ainda tínhamos mãe. E no
entanto era como se já não tivéssemos, porque a abraçávamos e beijávamos muito
e constantemente mas ela já mal reagia.
Nos últimos dois dias, deixou de comer, beber e falar.
Vi coisas naquele hospital que nunca esquecerei. Caras deformadas,
pessoas com uma cor tal que pareciam mortas, pais com filhos doentes, pais a
despedirem-se dos filhos, tal como nós fizemos com a minha mãe.
Chega a uma altura em que a única coisa que queremos é
acabar com o sofrimento daqueles que amamos. Custa muito.
Ana Silvestre
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